Desde o primeiro samba gravado – “Pelo Telefone” (Donga e Mauro Almeida) em 1917 –, o samba sofreu grandes transformações ao longo dos anos. Essas transformações não se dão apenas na forma de tocar, em que predominavam instrumentos harmônicos como flauta, violão e piano e hoje a base é dada por instrumentos de percussão como pandeiro, tantã e surdo, mas também na forma de compor as músicas. Atualmente os grupos populares de samba usam letras romantizadas e vazias de conteúdo, apenas para vender discos. Já os sambistas que obtiveram uma formação musical diferente desses grupos populares, compõem sambas que traduzem a alma do povo, letras usando a norma culta da língua.
O pagode foi considerado como um gênero musical pela mídia no início dos anos 1990. Com isso, as grandes gravadoras lançaram uma porção de grupos e artista que, devido à massificação nas rádios e TV, foram responsáveis por melhores arrecadações de direitos autorais no Brasil. Contudo, pagode nada mais é uma reunião de sambistas que tocam e cantam sambas em clima de festa.
Por ser um gênero musical criado nas periferias, o samba se torna um tema de fácil assimilação e aceitação do povo em geral. Com o apoio da mídia e o investimento de grandes gravadoras, no início dos anos 1990, o samba se possibilitou às pessoas de todas as classes sociais participarem das festas e das “rodas de samba” espalhadas pelo país.
Após uma queda do samba, no início do século XXI, os jovens das classes média e alta paulistana trouxeram à tona uma nova forma de tocar e cantar samba, sendo adotado pela mídia como “pagode universitário”, a partir disso, muitos que não iam a shows de samba passaram à ter um contato maior com o gênero.
É importante que se resgate as raízes, pois o samba acaba sendo esquecido e tomado por “modismos” como o axé, o funk ou a black music americana. Com esses modismos a mídia e as gravadoras acabaram deixando de lado o gênero e passaram a apostar nessas modas, pois no momento eram mais rentáveis a eles.
Essa explosão do pagode como gênero musical possibilitou a muitos artistas a projeção nacional no cenário da música. Mas porque muitos desses artistas não fazem mais o mesmo sucesso atualmente?
Atualmente os grupos da moda “pagode universitário”, em que a maioria dos seus integrantes largaram a universidade para tocar samba, praticamente “enterraram” clássicos do gênero, como os sambas de Cartola, João Nogueira, Originais do Samba, e apenas fazem músicas com letras romantizadas ou regravam músicas de outros ritmos, apenas para vender.
A falta de um planejamento consciente por parte de muitos artistas – que fizeram muito sucesso –, fez com que eles caíssem no esquecimento do povo, talvez, também, por falta de qualidade musical.
Já que os grupos da onda do “pagode universitário” trouxe as classes média e alta um maior contato com o samba, é válido que esses artistas relembrem músicas de grande sucesso no passado, como clássicos de Bezerra da Silva, Gonzaguinha, Cartola, João Nogueira, entre outros. Isso poderia fazer com que esse público tivesse um conhecimento mais aprofundado do gênero e faria com que artistas, às vezes, esquecidos no passado voltassem ao cenário musical e o samba recuperar o espaço na mídia que tinha em décadas passadas.
O samba teve sua maior modificação no fim dos anos 1970, a partir das rodas de samba realizadas na quadra do bloco carnavalesco Cacique de Ramos, no Rio de Janeiro, introduzindo instrumentos como banjo, repique-de-mão e tantã. Dessas rodas de samba, surgiram muitos artistas que até hoje são sucesso, como Arlindo Cruz, Almir Guineto, Zeca Pagodinho, Jorge Aragão e Fundo de Quintal.
O crescimento do público das classes média e alta fez com que o samba tirasse a imagem de música de negros, isso devido muito à onda do “pagode universitário” iniciada em São Paulo. Prova de que o samba é uma expressão popular que não difere raça, cor, credo ou classe social. Não importa se é novo ou de raiz.
O samba de alma suburbana tomou conta da elite e caiu no gosto popular, sendo moldado aos poucos pelas grandes gravadoras. Desde então, surgiu a expressão “samba de raiz” para designar o trabalho de sambistas tradicionais, que não sofriam “interferência” da indústria fonográfica, dos sambistas que sofriam essa “interferência”.
No aspecto sociocultural, o “pagode comercial” é tão relevante quanto o “samba de raiz”, pois, talvez, sem o sucesso de um no passado não teria como o fazer sucesso atualmente. A pluralidade e a diversidade de um fenômeno cultural estão ligadas justamente à capacidade de aprendê-lo em seus múltiplos campos. E o samba, por sua magnitude social, presta-se como nenhum outro gênero a nossas infindáveis discussões de brasilidade.
Por tudo isso que o samba é, além de um gênero musical, um caldo de cultura secular, raiz de nossas sintonizadas antenas parabólicas. E mesmo com tantas barreiras impostas pela sociedade, o samba nunca deixou de falar dos assuntos do cotidiano brasileiro, sejam eles compostos por artistas da nova ou da velha geração. É como diz um dos sambas do compositor da Estação Primeira de Mangueira, Nelson Sargento: “O samba agoniza, mas não morre”.